Quase fechando os olhos, imaginei se morresse subitamente, num dia como hoje.
Seria fatal, surpreendente, doído para alguns.
Meus pais ficariam inconsoláveis.
Meu irmão perderia minhas ligações tarde da noite, minhas conversas inseguras,
minhas frases feitas inventadas e as nossas gargalhadas em uníssono.
O Enzo esqueceria rápido de mim, olhando as fotos para registrar que um dia teve uma tia parte de pai.
Meus amigos não encheriam a capela do velório - sim, apesar de insistir em ser cremada, tenho certeza que minha mãe faria um enterro bem católico pra mim - e assim, todos passariam pelo caixãozinho semi-aberto, entupido de flores cheirosas demais - eu numa roupinha sei-lá-qual, pálida, inchada, super-séria.
E meus amigos sairiam do cemitério atordoados para se sentarem no primeiro bar que encontrassem - talvez o Mercado Municipal ou o Beira só porque já tá ali meio que na saída do Campo da Esperança.
O meu apartamento e meu carro velho vão para meus pais, já que não deixaria herdeiros, nem viúvo.
Meu emprego, esse tem tanta gente querendo que não teria problema algum achar substituto à altura.
A missa de sétimo dia seria na igreja ao lado da casa da minha vó. Aí sim, viria gente de tudo quanto é canto pra homenagear meus pais. O assunto durante a missa seria a causa mortis, o fato de eu ser tão nova, mas não ter nunca tido filhos, que faltava pouquinho pra terminar de pagar meu apartamento, que eu era uma moça tão boa, coitadinha, mas Deus sabe o que faz.
O fato é que o tempo passou, a vida me passou.
E se eu morresse, a falta que eu faria seria realmente frugal, simples e o pior - morreria também com estes que me amam.
Não deixaria obra, escrito, idéia genial nenhuma.
Não teria mestrado, doutorado, certidão de casamento.
Não descobririam conta bancária farta, nem manias escondidas atrás do armário.
Se eu morresse hoje, não seria nada demais, mesmo. Só mais uma alminha que sobe...
Só que a idéia de não ter filhos me bateu num sentido egoísta e fatal - sem reproduzir minha genética em outro ser, tudo que sou morrerá comigo. E essa conclusão idiota, de tão estranha, me deu medo. Tanto de não ter filhos, quanto de tê-los.
E aí que eu amei mais ainda o Enzo. Porque pelo menos ele leva um pouquinho de alguém de mim, meu irmão.
E aí que dormi mal, pouco e com sonhos sombrios de perseguição, medo, estranhos e escuros.
E aí que acordei. Tô viva, e lá vou eu pra mais um dia como outro qualquer...
Tem um momento na vida em que esse sentimento ancestral de propagação da espécie bate forte mesmo. Eu vivo pensando que não quero acabar em mim. E dá medo...
ResponderExcluirFabs, fiquei tocada com o q vc escreveu. e queria dizer coisas animadoras. mas acho q tô meio assim tb, sofrendo por algo imaterial, abstrato. e dói, né?
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