4.4.10

Feriado de Brasiliense: Chapada

Cheguei do feriado hoje.
Visitei o Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros, a 260 km de Brasília.
Praticamente o quintal de Brasília.
Dirigimos por 3 horas até São Jorge - uma vila que faz muita questão de continuar assim - e ficamos na pousada da Lana, a Palipalan (que é uma flor linda do cerrado, você conhece?)

No trajeto, tenho a sensação de que as cidades estão juntando as extremidades umas das outras. Mas, ainda assim, há muito Planalto nesse Brasil.
Os platôs altos e azulados combinam muito com o azul do céu. Que por sinal, estava cinza na maior parte do tempo. O Cerrado intercala com plantações de milho a paisagem. Gado pastando, matas ciliares, galerias.

O caminho vai acalmando a alma, serenando o coração. O belo da natureza me lembra a fluidez da vida que acontece independente de mim, da capital do país e, ao mesmo tempo, me dá a certeza de que estamos todos conectados, ligados por um fio que não esse da civilização. Um alívio traz um suspiro. Sorrio em silêncio.

Com as chuvas, o Cerrado fica mais verde e há flores por todo lado. É uma vegetação estranhíssima, com árvores tão feias que ficam lindas, folhas disfarçadas de flores; flores que parecem galhos.
No chão úmido, a areia branca e fina dá lugar a pedrinhas, pedronas, rochas escuras, mato fechado e de volta à areia fina.

O Cerrado é cíclico, ímpar, surpreendente e belamente estranho.
Demanda de mim uma delicadeza no olhar, uma mudança de perspectiva, um outro jeito de ver e sentir. O Cerrado deve ser olhado com a mente aberta. Ou nada se vê de especial.
Penso se as pessoas são também assim, carentes de um olhar especial, cada um de nós com belezas particulares, só vistas com olhos atentos.

Na chegada à cachoeira, uma cobra: fina, preta e amarelada, olhos pretos e redondos, segurando estática a metade de uma lagartixa na boca.
Estranhamente, não sinto medo, mas orgulho: uma honra enorme de estar nesse exato segundo vivendo no mesmo lugar que uma outra vida padece.
A conexão, o fio invisível, algo que foge das divisões geográfica, política, histórica.

Entro no poço raso de água fria e turva.
Começa a chover muito.
O frio inevitável me dá a real dimensão do meu tamanho nesse mundo imenso:
Um ser minúsculo, sem qualquer controle sobre o todo que me rodeia.
Mas o frio passa, a chuva passa, e seguimos para a próxima trilha, a próxima cachoeira.
Medito sobre o meu trajeto até aqui. Ouço com olhos fechados o ruído da queda d'água. Combina com a batida do meu coração.

No fim do caminho, exausta, dolorida, com frio e com fome, volto à vila.
No dia seguinte, da vila à Brasília.
Na minha casa, volto à realidade. Que no fundo, sempre teve a Chapada como um dos cenários, mas sou eu que a esqueço quando sigo a vida olhando os dias com olhos duros, domados pela rotina da cidade e tanto fios que me amarram aqui e ali.

É, a Chapada mora em mim. O Cerrado mora em mim. Porque eu moro em Brasília e, aqui, esse fio estranho da natureza com o ser humano parece ser mais visível, quase palpável, e muito real. É só olhar para o céu. Ouvir o trovão. Tocar nessa terra vermelha. E sentir o coração bater como a queda da cachoeira.




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