31.10.07

Clima de vida

Essa seca, esse calor,
tudo é tão insuportável que convida
Ao tão desejado ócio criativo, como prega minha amiga Cris.

As noites com livros, filmes, ventiladores soprando madrugada adentro.

Não que eu tenha tido boas idéias, mas praticar o ócio é isso mesmo:
As idéias demoram a chegar, lentas como esse tempo que não passa...

Mas, trabalho feliz, faço minha meditação (ou tento com força, pelo menos)
E deito pra dormir - o que não significa que durmo.
Aliás, eu não tenho dormido nada ponto.

Eu tenho a nítida sensação que a minha vida vai mudar
Quando o clima mudar também

Flores Vermelhas

Entre o circo e a vida
Entre a vida e o trabalho
O trabalho e a casa
O livro e mais outro

O Templo
A yoga
O silêncio
A cigarra

Entre o dentro e o fora
Tem um flamboyant que aflora

24.10.07

Vinte reais descartáveis

Decidi meio de última hora experimentar a tal aula de yoga, pertinho da minha casa.
Como já estava na rua, passei na Riachuelo pra comprar uma calça dessas de malhar, a mais baratinha possível. Escolhi umas três - uma barata, uma média uma cara - uma de 20, uma de 25, uma de 35 reais. Peguei umas camisetinhas na arara de promoções - 9 reais cada.

Fila gigante no vestiário. Sede. Calor abafado. Uma mulherada feia de doer. E ninguém com a menor pressa.

Experimento tudo. Acho tudo muito mais ou menos, mas pô uma camiseta por 9 reais? Vou levar! A outra por 15 reais? É, a malha é melhorzinha, vou levar. A calça, bem, não gostei de nenhuma, mas entrei na loja justamente pra comprar uma calça e ir pra yoga! Vou levar a mais baratinha mesmo...

Fila gigante pra pagar. Uma moça no caixa, três outros fechados. Todo mundo abrindo a bolsa, pegando a carteira, olhando o planeta girar sem a menor pressa.

Gastei quase 50 reais. Muito dinheiro. Ainda mais pra quem nunca nunca nunca faz isso de entrar numa loja assim...levei três peças e não amei nenhuma. Mas agora, tinha o que precisava pra ir à tal aula experimental de yoga.

Cheguei faltando cinco minutos pra começar. Troquei de roupa, pus a calça Riachuelo, sentei no chão. O professor atrasou quase vinte minutos. A aula então das 6h30 começou às 7h. OK.
Estica e puxa, respira e expira. Fecha e abre o olhos. Meditação deitada? Ix, dormi!
Namastê.

Em casa, com calor e fome, fui pro banho. Tirei a roupa. A calça da Riachuelo estava inteira rasgada! Isso mesmo, na costura da bunda, que você vê a calcinha da moça!

Me deu uma vontade de dar uma de Michael Moore e ir lá na casa do dono da Riachuelo com a calça rasgada e suada e perguntar pra ele se ele pagaria 20 reais por um produto descartável.

Ainda bem que a meditação e a yoga estão fazendo efeito. Ainda bem que eu ando tão zen que até eu estou me surpreendendo...vou costurar a calça e usar em casa, pra dormir, pra fazer faxina...e nunca mais piso na Riachuelo.

Hoje tem yoga. Vou chegar 6h15 e já trouxe a calça de casa. Não tem comprinhas surpresas na minha vida tão cedo.

23.10.07

Vidro

Maria Clara, 2 anos, Pedro, 4 anos, e eu, (tá, 35 anos) assistindo um desenho animado.
Clara:
- Agora vem o gato mau, ele vai pegar o Topo Gigio
Eu:
- Ai, eu morro de medo do gato mau! Vou fechar os olhos! Me digam quando acabar essa cena!
Pedro:
- Não, Fabiana! Pode ficar de olho aberto! Essa televisão tem um vidro bem bem forte, o gato não passa de jeito nenhum!

Ah, tá...vou ficar de olhos abertos, então...

21.10.07

Incômoda

(este post foi publicado primeiro em: perfumesevenenos.blogspot.com)

Quando dirijo, torço para não ter ninguém na faixa de pedestres
É que detesto ser aquela que pára o trânsito
Quando sou pedestre, rezo pra chegar na faixa e não ter carro nenhum
É que fico péssima de parar 2, 3 carros pra eu atravessar

Me apresso no caixa do mercado
É que fico constrangida de fazer a outra pessoa esperar eu pegar a carteira, o cartão, arrumar os saquinhos...vou fazendo tudo de uma vez, pra não atrapalhar o próximo

Chego mais cedo sempre
Não consigo pensar em alguém me esperando chegar por 2, 3 minutos sequer

Tenho uma dificuldade enorme de pedir favores, ajuda, um help qualquer
Fico vermelha só de pensar na situação de ter alguém esperando por mim

E não ligo nem para os melhores amigos sequer pra pegar um cinema
Temendo um momento errado ou ser indesejada por um motivo qualquer

Subo as escadas do prédio com os tamancos na mão
Detesto pensar que fui eu que acordei a vizinha insone

Minha porta não range, minha chave, eu dou uma volta só
Pra ser rápida, silenciosa, invisível

Estaciono meu carro apertado nas vagas
Pra sobrar lugar pro próximo que ainda virá

Espero os outros se servirem
E minto que estou sem fome
Se vejo pouca comida
E muita gente

Num grupo de pessoas
Tombo sempre pro lado com menos adeptos
Na esperança de criar com eles, um elo qualquer

Me anulo
Me antecipo
Me isolo
Porque acho que incomodo

E à noite no escuro, sozinha no quarto
Me pergunto se alguém
Faz isso por mim também

Aposentadoria

Na mesa do almoço, conversa de adulto:
- E a mãe do Fulano, Fabi, já está aposentada?
- Não, coitada, ainda trabalha até hoje!
E a Júlia, 7 anos, com dedo indicador apontado:
- Ah, eu vou pedir minha aposentadoria antecipada!

(sim, ela usou a palavra antecipada com veemência)

Pequenas sutilezas de uma manhã de sol

Ele estende a canga pra ela deitar
Ela deixa ele na sombra do guarda-sol
O menino divide o castelo de brincar
O pai escuta em silêncio as histórias do mar

Velhos, feios, loucos, de mãos dadas na calçada
Cão e dono se entreolham no farol

Um afago na menina do chiclete
Um violão toca insistente
e desafinado o suficiente
Faz ela rir, rir, rir

O irmão que acha o gêmeo perdido na areia cheia
Ó o mate, a canga, ó o milho
que trocam de mãos com suaves sorrisos

E eu aqui. Nas sutilezas dos pequenos amores diários da praia de Ipanema.

Gatas de praia

- lindo
- nossa, eu fiquei louca
- já tinha visto ele onde?
- passo lá na frente todo dia, fico paquerando ele.
...
- é, mas hoje em dia não vale ser de marca, não. melhor comprar óculos aqui na praia mesmo.
- já é.

Preguiça

Eu hoje acordei com preguiça de sofrer
Andei pelo vento na areia fofa
Chorei com gratidão
pelo samba
pelo riso vazio
pelo Dois Irmãos
Saudades de agora
Já sinto falta de mim quando sei que mais tarde
Sou outro alguém

Eu hoje acordei sem vontades
Nem de ir, nem de ficar
E nem de achar um lugar

(escrito em 14/10)

Tempo

A nuvem anda na areia

(escrito em 13/10)

O mar de Ipanema

O que é do mar que extasia?

Anáguas de ondas
do ruído igual mas diferente
Insistente, constante

Carneirinhos lá longe é sinal de mau tempo
Ressaca na praia

Pixains afundam na espuma
Risadas, gritinhos, dispersos

O que é do mar que tanto encanta?

Do vôo, do som, do vento
Da que branqueia a crista da onda verde
que mexe a areia
que vira o menino

(escrito em 12/10)