30.5.09

Luzinha

Na floresta, no escuro
acende apaga
pisca-pisca
vaga-lume pousa e voa
pisca-pisca
acende apaga

eis que surge no caminho
pisca-pisca
acende apaga
homem triste e sozinho
pisca-pisca
acende apaga

por aqui, fala o inseto
acende apaga
e pisca e pisca
meu azul te ilumina
pisca-pisca
acende apaga

vem comigo, meu amigo
pisca pisca
acende apaga
o caminho eu sei mostrar
pisca pisca
acende apaga

lá vai longe
aquele homem
e na frente o vaga-lume
zigue zague
pisca-pisca

seca o choro
guia o riso
pisca-pisca
acende apaga
ó que o homem já sorri

a manhã nasce dali
o caminho chega ao fim

diga adeus ao vaga-lume
que da luz já não precisa
é dia claro na floresta
acende apaga
não precisa

vá em frente, meu amigo
diz o bicho vaga-lume
quando for tempo de choro
chama o azul e eu te guio

beija o bicho o homem some
pisca-pisca
acende apaga
vai a luz do vaga-lume
branda e fraca em meio dia

vai embora vaga-lume
pisca-pisca
vai sozinho
acende apaga
num soluço
a saudade do amigo

(com um beijo azulado, para Pedro)

27.5.09

A velha nua

...sobre o video aí embaixo....

A coisa que mais me impressionou assim que cheguei em Nova York - em setembro de 1996 - foi o número de loucos na rua.
Pessoas chorando sentadas no chão, outras falando sozinhas em línguas indecifráveis. Gente nem tão suja, nem tão feia, mas com olhos vidrados no nada.
Passava por elas imaginando o que teria acontecido a tanta gente para simplesmente se tornarem carcaças ambulantes.
Logo a resposta começou a chegar: fiz amigos, arrumei um emprego, mudei de casa, comecei a namorar, tudo lindo.
Eu era uma nova yorkina perfeita: trabalhava muito, malhava pouco, fins de semana na grama do Central Park, brunch com amigas, cinema com namorado.
Até que - perdi o emprego. Sem dinheiro guardado para mais de um mês, nos meses seguintes, estava completamente deprimida. Não sabia o que fazer, por onde começar, a quem recorrer. E com muita vergonha de ter fracassado.
Entrei numa depressão tão profunda que pensei em morrer.
Eu pirei total pela primeira vez na vida.
E escondia dos meus amigos porque claro, nenhum americano teria pena de mim. Para eles, desempregado é um fraco de caráter, anda junto com traficantes, ladrões de velhinhas.
Sofri calada e quanto mais calada eu ficava, mais sofria. Comia miojo noite e dia e andava a pé - para guardar o dinheiro do metrô - e aí comecei a olhar nos olhos daqueles loucos. Com alguns, trocava palavras - hello - com outros, dividia o almoço do dia - o baggle com cream cheese - me sentia cada vez mais à vontade quase pertencendo ao outro lado da maçã. O lado improdutivo, fraco, pobre e sujo. E louco. O lado podre da Big Apple.
Numa tarde morna de verão - eu acho que voltava de mais uma entrevista de emprego - eu a vi.
Lá longe, entre o meio-fio e a fila de carros no asfalto, vi um ser movendo-se languidamente.
Uma velha morena, alta, muito magra com cabelos brancos e compridos até os ombros, esvoaçados ao vento quente - uma velha andando no meio da rua, não na calçada como toda a multidão de pessoas, mas na pista de carros. Se aproximando de mim, ela olhava fixo para o nada. E estava totalmente nua. Sem sapatos, nua. Andando, nua.
Na mesma noite, confessei para o meu namorado que estava pirando pra valer - ele me olhou fundo nos olhos e fez um escândalo - praticamente me chamou de idiota, burra, estúpida - e me convenceu a procurar um emprego qualquer, de garçonete que fosse.

Duas semanas depois, estava empregada como office girl num escritório de arquitetura e decoração. Pagava contas no banco, devolvia amostras de tecidos e anotava recados de grã-finos.

Paguei as dívidas, voltei a andar de metrô, saí da depressão. Passei anos sem comer miojo. Mas nunca mais olhei aquelas pessoas com olhos distantes. No fundo, somos todos iguais. Eu só tive uma chance a mais. E a velha nua ainda me visita vez ou outra em sonhos e pensamentos.

23.5.09

Aliança

A PEDIDOS...

Um anônimo me pediu para escrever sobre anel de compromisso, aliança, para ter um ponto de vista feminino sobre o assunto.
Bem, o problema é que meu ponto de vista, além de não ser muito padrão - porque eu não sou padrão pra nada - eu tenho 36 anos, e a minha geração nem tinha essa coisa de anel de compromisso. Para gente da minha faixa etária, o anel de compromisso É o anel de noivado - ou seja, aquela aliança que você vai por no dedo pro resto da vida, ou melhor, vai tirar do anular direito e colocar no esquerdo.
Anel de compromisso é coisa de gente bem mais jovem e eu entendo essa novidade da seguinte maneira:
é muito normal hoje, você sair e beijar na boca. Muitas vezes, até mais de uma boca!
Dai, quando você beija uma boca que gosta e quer beijar mais, começa a namorar.
Só que hoje em dia, namorar também é uma coisa bem aberta - do tipo tudo bem chifrar, já que todo mundo chifra - e bate aquela mega insegurança.
E aí, vem o anel de compromisso. Do tipo, se você beijou, gostou, beijou de novo, namora e não quer ser chifrado, usa um anel avisando o resto do planeta - EU SÓ BEIJO UMA BOCA POR UM BOM TEMPO AGORA.

Sinceramente, acho válido. Se é isso que vai fazer você manter um acordo com a sua namorada, legal.
Eu nunca tive anel de compromisso. Para mim, se eu beijar mais de uma vez e quiser namorar, já ficou subentendido que aquela pessoa que eu escolhi merece todo meu afeto, carinho e beijos mil - até que provem o contrário (ou ele prove o contrário) - Nunca senti a necessidade de ter um anel do meu dedo - e no dele - para me lembrar do sentimento que tenho - QUE É O DE SER FIEL AOS MEUS SENTIMENTOS.
Da mesma maneira, muitos homens quiseram namorar comigo e eu fui fiel a mim - Desculpa, mas no momento, eu não tenho como namorar ninguém porque estou a fim de ficar solteira, beijar muitas bocas, não ter compromisso com o coração do outro - e daí que não tinha namorado, nem aliança. E nem chifre.

Mas se anel de compromisso é novidade pra mim, eu já tive um anel de noivado. Ganhei de um namorado muito apaixonado, que quando soube que eu estava indo embora, me deu de presente numa caixinha de fósforos. Fiquei muito emocionada, chorei, agradeci, mas não usei. Ou melhor, usei por uma noite. E achei uma grande farsa.
A aliança dourada novinha no meu dedo direito era um lembrete de que aquele homem me levava a sério, queria construir uma vida comigo e estava pagando pra ver. Eu o admiro por tudo isso até hoje. Mas eu não queria aquilo. Falava que sim, mas não era com ele. E a aliança acelerou o término que já viria de qualquer forma...
Numa conversa franca, admiti que não dava mais pra mim. Eu amarelei e devolvi a aliança na caixinha de fósforos.
Choramos os dois abraçados, as alianças juntas, um círculo dentro do outro, vazias de dedos.

Não me arrependo.
Tenho orgulho de um dia ter tido alguém que me amou tanto que me ofereceu um lembrete de ouro para carregar comigo.
Mas eu não queria. E apesar de tê-lo magoado profundamente, sei que hoje está feliz, casado (de alianças ou não), encontrou alguém que honrou o amor dele.

Nunca usei aliança. Nem anel de compromisso. Mas meus dedos nus são lembranças constantes das escolhas que fiz até aqui: sempre fiel aos meus medos, sentimentos e desejos.
Mesmo que ainda sem um par. sei que tudo pode mudar.
E nessa altura da vida, o menos importante é uma aliança no dedo esquerdo para me lembrar quem sou.

Acho que é isso anônimo...pelo menos é o que sinto hoje, agora, enquanto escrevo esses rabiscos para você!

19.5.09

Corpo examinado

Estou com o pior hematoma no braço direito que eu já tive na vida - mentira, o segundo pior, sendo o primeiro aquele que o médico americano me aferiu com inúmeras agulhadas erradas assim que ganhei na loteria do greencard.
Este ano, na minha peregrinação de médicos e exames, não fui boba não e levei minha mãe comigo.
Assumi de uma vez por todas que eu não tenho estômago pra aguentar uma simples sequência de exame de sangue, urina, imagens com dopler, contraste, bla bla bla.

Sou frágil.
Sinto pena de mim e uma insegurança imensa me toma quando me deito de barriga pra cima e aquele gelzinho se espalha na minha barriga - e se eu tiver morrendo?
Fico com vontade de chorar depois de tirarem tanto sangue de mim. Aquele choro de quem quer um algodão doce, e não seguir em frente no corredor e virar à direita para mais exames, sabe?
Demorou muito por muitos motivos. Fiquei muitas horas sem comer antes e depois...fiquei de pé na fila, fiquei sem roupa, fiquei triste.
Tudo isso me deixa triste.
Porque me dou conta, na verdade, já estou morrendo: minhas células, meu sangue, tudo morrendo.
E continuo só.

16.5.09

Voluntariado

Quando morava em Nova York, tive uma vontade enorme de adotar uma causa, ser voluntária em alguma instituição.
Comecei minha busca num gigantesco site de voluntários, que você vai eliminando as possibilidades da seguinte forma
quer trabalhar com gente, bicho, mato,
quer trabalhar todo dia, toda semana, todo mês

Fui selecionando e restrigindo a busca até ficar
Sem nada!

Notei que todos os voluntariados mais interessantes são aqueles que demandam TEMPO, TREINAMENTO, DISPOSIÇÃO

Daí, fui trabalhar na WCS - ong ambientalista dentro do zoológico do Bronx, que aliás oferecia vários tipos de voluntariados - e fui pesquisar sobre ser voluntária com os gorilas - os animais mais fantásticos que eu já vi na vida. E daí que para ser voluntária com os cuidadores de gorilas, o treinamento era de UM ANO, isso mesmo, para ser voluntário uma vez por semana, por duas horas, era uma coisa de louco. Desisti.

Agora, estou envolvida até as tampas com o Templo Budista
E começo a notar o porquê as ongs sérias e competentes são tãoo exigentes quanto aos voluntários.

Porque para ser voluntário, você tem que trabalhar muito, com vontade e sem reclamar.
E isso é pior que ser pago por um serviço. Porque a cobrança é emocional.
E a demanda é intensa.

Estou ajudando o Templo na organização do Congresso de Jovens Budistas e minhas funções variam bastante. Somos poucos voluntários e cada um com uma demanda de tempo, dedicação e interesse diferentes. No início, isso me irritou muito - ficava comparando minha dedicação com a dos outros; ficava reclamando que as pessoas não faziam as coisas direito, com amor, com empolgação!
Daí, durante a prática da meditação que dei na quinta, me veio uma luz - eu devo fazer com amor tudo que faço.
Ganhando dinheiro, doando meu tempo, minha boa vontade. Nada mais é tanto relevante quanto estar no presente, aqui e agora, fazendo com atenção e carinho o que eu me sugeri fazer!

E finalmente, me veio o insight principal - eu passo muito tempo reclamando: na minha cabeça, eu reclamo de acordar cedo, de ter combinado coisas que na verdade eu quero muito fazer, de ter deixado de fazer isso ou aquilo. De fato, não é uma questão de ser preguiçosa, mas de ser RECLAMONA! Céus como isso é insuportável! Nem eu aguento minhas próprias reclamções, imagine as pessoas ao meu redor!

Bem, desde de quinta, combinei comigo mesma que tudo bem reclamar - mas quando começar, devo me lembrar do porquê decidi fazer isso ou aquilo ou tomar essa ou aquela atitude... - e então, eu tenho que calar a reclamação ou simplesmente, cancelar o compromisso - sem estress, sem neuras - só farei as coisas das quais eu não vou reclamar.

Gente, funcionou! Acordei para ir para a reunião no Templo sem sono, no horário, e só com um POUQUINHO de reclamação. Foi ótimo. O tempo voou. Fiz todas as outras coisas no dia com o mesmo pensamento! Funcionou!

Agora sim, sou uma voluntária de verdade!

14.5.09

Cascavel

VIRGO [August 23–September 22] The scenario I'm about to describe is likely to happen only in your dreams or fantasies. But it will later have a correlation in your waking life and perhaps will be instrumental in preparing you mentally and emotionally for the triumph you'll be able to accomplish in your waking life. So here it is: A python will slither up and begin to coil around you. With an apparently irrational instinct that turns out to be quite smart, you will hiss loudly and then bite the snake, causing it to slip away and leave you alone.

9.5.09

Dia das mães que esperam

Amanhã vou presentear e esperar que um dia também chegue minha vez

Ainda frustrada e sem saber como resolver o dilema da maternidade, já tive várias ideias nos últimos tempos.
É claro que no fundo, ainda tenho o sonho dourado da família tradicional
Ter um companheiro que será também o pai dos meus (mais de um) filhos.
Mas há tempo?

Quando esse conflito aumenta e a angústia cresce, penso nas minhas inspirações:

Nas incríveis mulheres que conheço que foram mãe depois dos trinta - umas se casaram antes, outras depois;
E outras não se casaram, mas não abortaram.

Admiro duas ou três amigas que trabalham oito, dez horas diárias e ainda assim, encontraram um par e fizeram um ninho só delas. Dividindo a atenção entre casa, filho, marido, profissão, elas não me parecem mais infelizes que eu - que não divido nada com ninguém.
O tempo corre contra meu sonho inicial, e quanto mais rápido eu sonhar um sonho novo, mais chances terei de fazê-lo real:
vou adotar um bebê?
vou fazer um filho sem avisar a outra parte envolvida? ou aviso mas não me apaixono?
ou faço um filho sem paixão alguma, com um amigo gay que tem dotes de inteligência extraordinária mas é feio pra chuchu?
inseminação artificial?
troco de apartamento? faço concurso público?
conto pros amigos?

Afinal, quanto de coragem preciso juntar para finalmente bater o martelo na decisão que será a correta simplesmente porque foi a que eu tomei?
Para mim, tudo se resume a - CORAGEM
para decidir e não se arrepender no primeiro impasse
para fazer sorrindo o que tantos outros vão achar impossível
para assumir com serenidade - vou ser mãe solteira, produção independente; vou adotar uma criança carente, o filho da faxineira;
vou ser mãe PORQUE SIM! E por que não?

Nelas, nas minhas musas, enxergo essa coragem.
E adaptabilidade: porque a vida aos trinta e tanto não é o que sonhamos aos quinze.
E estas mulheres tiveram a sabedoria para entender que "o tempo ensina a gente a viver" e que os sonhos precisam ser refeitos todos os dias, até caber na cabeça de agora, no mundo de agora. Na hora de agora.

Para elas - Andreas, Marianas, Erikas, Anas, Lucianas, vão meus sinceros desejos de um domingo feliz, rodeado de suas crias!
Ainda pensativa e covarde, um beijo da fabi.

7.5.09

Tempo

"O tempo ensina a gente a viver"
(dona Antônia, 50 anos, empregada doméstica da família há 20)

4.5.09

Mundos virtuais, nem tanto



Conhecia estas almas, de leitura e sentimento
Mas olhar nos olhos sempre tem um certo, digamos alento
É carência de pertencer, eu sei
Mas é sempre bom saber

Que num mundo de estranhos
e normais mortais
Faço parte,
Pertenço a
Tem um lugar pra mim!

Com tantas bolhinhas
E muitos sorrisos
Saio pensante
com um só palpite

Nesse mundo tão grande
Com a cidade tão vazia
Não é mesmo uma dádiva
Dividir com palavras
O virtual e a vida?

Um beijo em cada olhar
Um sorriso de gratidão
Para cada um que escreve a alma
E comigo dividem num espaço de página
A mania de ser diferente,
Mas igual a toda gente!

Um brinde ao I Encontro de Blogueiros na casa da Marcya Reis!