29.4.10

Gerações

Minha avó materna, Ignez (oitenta e tantos), segura a bisneta Sofia (oito meses e tantos dias) no dia do Batizado desta última. Lindas.

28.4.10

Xópin Cênter

Passei no Shopping Center para fazer minha carterinha estudantil - sim, eu sou estudante de verdade esse ano - e comprar um presente de aniversário.

Meu, como eu detesto shopping!
Realmente, tudo me deixa irritada:

Eu não gosto da luz dos shoppings: excesso de luz branca, tão diferente da luz do sol!
Uma luz que ofusca, que não cria sombras, nuances, texturas...
todo mundo fica sem contorno, figurinhas coladas num álbum.

Eu também não gosto do cheiro: um cheiro de comida se mistura com o do número incrível de pessoas: suvaco, perfume, creme...atchim! Aroma de hambúguer com lavanda, não dá!

Me incomoda muito também a poluição sonora: as pessoas parecem falar mais alto, porque há música tocando nos corredores!
E perto de cada porta de loja, outra música sai lá de dentro!
Os sons se misturam desorganizadamente, provocando uma ansiedade que nasce nas orelhas e entra para dentro da testa, bem aqui, no meio dos olhos.

E os olhos, só enxergam nos largos corredores, as vitrines - cheias de coisas diferentes, que no fundo são todas iguais: é o que chamam de moda.
Essa moda que quase nunca combina comigo (combina com alguém?); e se combina, eu não tenho a menor vontade de usar...
estou sempre no antepasso da moda shopping center: quando o bico é fino, procuro tamancos; se a moda está bege, quero o roxo batata;
e quando todo mundo cansou do pink, caí de amores!

E até a livraria, ah, uma livraria!
Nem ali eu fico sossegada - a pessoinha dentro de mim pedindo peloamordobuda vamos sair daqui.
Compro a lembrancinha de presente de aniversário e sumo dali.

Dor de cabeça. Ansiosa. Quase triste.
Será que é por isso que as pessoas compram por impulso nos shoppings?
Sou só eu?
Na esperança de silenciarem tanto desconforto, usam o cartão de crédito no que acreditam precisar urgentemente: hoje, eu vi uma bolsa que tenho que ter.
Custa quase 400 reais. Quase dez cestas básicas. Um bolsa vazia.

Saí da loja, saí do shopping. Era hora da minha meditação no Templo.

Aqui, longe da bolsa e da meditação, não preciso de nenhum dos dois.

Mas voltarei à meditação.
Já ao shopping, não voltarei tão cedo!

24.4.10

Fé e religião

Comecei minha vida religiosa muito cedo.
Fui batizada antes de completar um ano.
Aos dez, fiz minha primeira comunhão num colégio Católico.
Nesse dia, tive um desentendimento com o padre. Estava de mini-saia e ele achou ruim eu chegar na casa de Deus vestida daquela maneira. E eu achei péssimo ele falar mal da minha melhor mini-saia pra ir visitar a casa de Deus. Enfim.
Confissões feitas e comunhão recebida, nunca voltei à igreja para ser Crismada. E com o andar dessa carruagem, acho bem provável nunca subir ao altar na cerimônia do Casamento.

Anos depois, em 2008, me converti ao Budismo depois de frequentar o Templo por um ano.
É pouco tempo, eu sei.
E uma decisão muito séria. Pelo menos para mim, é.

Acho difícil explicar o que me aconteceu, mas é mais ou menos quando a gente chega em casa de uma longa viagem: o passeio foi incrível, mas voltar para a nossa casa, nossa cama e lençóis é a melhor sensação de todas!

É claro que não dá pra saber se daqui a trinta anos, serei umbandista, espírita ou me converter a outra religião - e até voltar para o Catolicismo.

Mas acho estranhíssimo a postura de se mudar de religião a cada um, dois anos porque brigou com alguém da igreja ou da comunidade; porque discorda do jeito que as coisas funcionam na administração do centro ou do templo...

A única explicação que tenho é: ter uma religião é a parte mais fácil da fé.
O difícil é praticá-la na sua comunidade, com as pessoas mais distintas possíveis de você;
o complicado mesmo é aplicar aquilo que é lindo nos livros, sutras, bíblias e alcorões, no cotidiano dos templos, igrejas, centros...

No Templo Budista, tenho muitos colegas.
Fiz um, dois amigos. E ainda assim, pessoas que sequer conhecem minha casa!
A maioria dos budistas que conheço tem muito pouco em comum comigo - são pessoas mais velhas, com mais poder aquisitivo, casados e com filhos grandes.

Nas atividades do Templo, como voluntária, tenho que lidar com gente de todo tipo, budistas ou não, que desafiam minha capacidade de ser bem educada - que dizer de ser budista!

Confesso que em muitas situações, me irritei, praguejei e até falei mal das pessoas.
E em outras, simplesmente desisti de estar presente, exausta da demanda que o ser humano impõe quando quer ser chato de galochas - como diria Emília, a mais inteligente das bonecas de trapo.
Nunca entrei em um embate, deixei esse estilo na adolescência e aprendi que uma boa briga se ganha de outras formas. Também porque, com o Budismo, entendi que o silêncio é meu melhor amigo nas horas em que tudo que quero fazer é soltar os cachorros e cuspir marimbondos.
O peso da minha mudez já moveu opiniões. Inclusive as minhas próprias.

Mas, mesmo sem grandes amigos no Templo, mesmo sem muita paciência para conhecer pessoas tão diferentes, mesmo com pouca habilidade para lidar com gente rude, estranha, até agora, eu não desisti da minha fé.
Eu confio sinceramente que aonde estou e no quê acredito não estão ligados intrinsicamente ao fato de o Templo ser ou não meu lugar de amizades e afetos...

E tenho certeza absoluta que é exatamente este o meu caminho budista:
Cheio de gente diferente; gente mesquinha, vaidosa, covarde, metida; gente como eu - com defeitos - que busca a luz do Buda no próximo - quando talvez devêssemos estar emanando a luz do Buda PARA O PRÓXIMO.

Nesse caminho, não há retrocesso, disse o monge Sato.
Eu não desvirei católica para virar budista.
E não sei como será meu caminho de fé para os próximos 30 anos.
Mas sou uma pessoa melhor do que eu era antes porque tenho uma fé aplicada a uma religião.
E esse compromisso - do que eu quero da religião que escolhi e das coisas que acredito - me dão forças para eu seguir aprendendo e conhecendo pessoas de todos os jeitos e maneiras.

para o meu amigo-budista, Bruno.


23.4.10

Bonança

Fora a preguiça que me assola - o Pecado Capital dominante em mim - realmente o ano começou, de novo!
Fiz meu exame de ressonância magnética com dopler da tireóide.
E ... tchan!!!!!!!! Achei que não fosse possível, mas o encolhimento desse glândula que tanto me preocupou no ano passado...sumiu!
A minha tireóide cresceu!
Como? Ah, a gente teve uma conversa de garotas...

No ano passado, o mesmo exame acusou uma redução de 8 para 5 cm cúbicos. A produção de hormônio estava normal, mas uma glândula diminuir é motivo de preocupação, já que não é legal uma mulher adulta ter glândula de menina.
Bem, daí que ontem, depois de ouvir o barulhinho interno dela (vocês já fizeram esse exame? É sensacional ouvir o pulsar do seu corpo...o sangue, a pressão...)
veio o resultado:
de 5 cm cúbicos, minha tireóide mede agora distintos 6,9 cm cúbicos!
Hehe, um número sugestivo...

De presente para ela, parei numa lojinha de presentes - pensei em comprar bobages para a cozinha ou umas velinhas cheirosas...ei que vejo um Buda!
O Buda Amida!
O Buda que procuro desde que fiz a iniciação!
Um Buda em pé, com as mãos espalmadas para fora, olhos semi-cerrados, e o sorriso da Mona-Lisa (seria ela iluminada também?) - uma estátua do Buda exatamente como eu queria!

No Budismo, quando fazemos um altar em casa, a casa se torna a morada do Buda.
Meu corpo é o altar da mente tranquila.
E minha casa, a casa Daquele que está Desperto.

Gashô.

22.4.10

Rebordosa

Eu não sei vocês, mas estou numa ressaca monstra da Festa de aniversário de Brasília.
Nem fiz grandes farras. Fugi da muvuca da Esplanada.

É que para mim, as duas últimas semanas foram tão intensas!
Não nas rotinas, no cotidiano...
Intensidades lá no fundo, no meu coração, na minha alma mesmo.

Tenho a sensação que transitei por placas tectônicas em movimento.
E agora, finalmente, elas cessaram.
Na estabilidade, percebi coisas fora de lugar.
Que na verdade, estão no lugar certo agora, e não antes.
Interessante.
Seria o aniversário de Brasília?
A chegada da Primavera?

Ciclos se fecharam.
Pessoas se foram. Outras voltaram.
Eu me reencontro de volta ao meu corpo depois de um estranhamento desconfortável.

Hoje é como se fosse Primeiro de janeiro.
Aquele dia que a gente acorda já no fim do dia pensando que tem o ano inteiro pela frente!

Acordei de um Reveillon.
Uma passagem de etapa, de fase.

Estou desperta.
No corpo e na mente.
Viva.
A veras.

20.4.10

18.4.10

Domingo à tardinha

Em Brasília, o fim de tarde é tão lindo que chega à beira da cafonice.
E eu não sei porquê o por do sol do domingo é o ápice dessa ideia.
Fica quase religioso, angelical. Totalmente piegas.
A cara do brasiliense.
A minha cara.

Eu adoro os domingos.
Especialmente assim, como os de hoje:
teve sol, teve vento.
teve Beiras e cinema.
E teve o por do sol.

O céu cheio de nuvens, até parecia que vinha chuva - cinza chumbo, branco gelo.
E a hora que o sol vinha caindo, refletia aquele pink-chiclete nas nuances de branco-cinza das nuvens e...
Ai, difícil achar palavras...

Falar sobre o por do sol de Brasília é igual descrever um sentimento, assim, o amor:
Não basta só falar da reação física - o coração palpitar, o sorriso abrir - das cores e tons - o turquesa do céu, o laranja do sol - tem que por o som alto no rádio, abrir a janela e botar a cabeça pra fora gritando - ahhhhhh!
E ainda assim, impossível fugir do kitsch, do brega...

O por do sol em Basília é apoqiweqruaslkd
Assim como o amor é apoqizxcvzb
Sabe?

Sabe, sabe sim.
Todo mundo sabe.
E se não sabe até hoje, vem aqui pra saber, vem...

dedico um por do sol de Brasília para cada amigo que mora longe. Saudades!


17.4.10

Sem encontro no encontro

Se meu passo é muito rápido
E meu rumo não é o seu
Eu me calo
Num resguardo
Nesse quarto azulado

Mas se espero aqui no canto
Um convite ao caminhar
Me espanto - um momento
Quando a voz chega no vento
Falando de um outro lugar

É você chamando longe
Eu respondo hesitante:
Se eu sair do meu caminho
E andar devagarinho
Chego perto de você?

Ou será, distante fico
De mim e do meu querer
Pensando em ficar com você?

Se eu falo isso agora
E nunca escuto você
É por medo da voz calada
Ouvir o surdo canto
Dessa saudade gritada

Então ando assim no meu passo
Aqui de longe mirando você
Que anda no outro traço
Em outra linha, de um espaço

Mas ah! se um dia der certo
E o vento fizer parar
O meu trotar na sua vida
A sua vida no meu passar
Eu desacelero o mundo
Eu mudo de prumo, de fato
Pro rumo do seu abraço




intensa assim. fazer o quê. beijo pra você.



14.4.10

Aqui é meu local de trabalho

recebi essa foto por email, não sei dizer quem é o autor. mas olha que lindo esse ângulo do prédio do congresso nacional!
entro por baixo dessa longa rampa todas as manhãs e confesso: sinto um orgulho imenso de ser uma formiguinha trabalhando ali!

13.4.10

O Guri

Acordei. Acordei do que seria a morte, mais uma vez algo deu errado. Não quero me rasgar o peito com uma lâmina cega de cólera, nem ter meu crânio estilhaçado por uma bala, não quero sangue. Além disso, esses dois modos são arriscados demais, posso sobreviver com sequelas e cicatrizes. Seja como for, seja limpo, dê o mínimo de trabalho aos outros.

Merda! Mijei na cama, to velho pra isso, ou ainda muito novo. Minha camisa serve como pano de chão, acho que dá para absorver o pouco de urina que tem. Não enxergo nada nessa escuridão, a cortina não revela se é dia ou se é noite. Sinto que dormi alguns dias, sinto um estranho gosto de vinho e cigarro na boca.

Já sei. O vinho fazia parte do meu rito de passagem, de uma vida para um nada. Era um cabernet sauvignon com comprimidos de dormonid, valium e lexotan. Maldita ressaca, essa mistura quando não mata te faz mal. Misturemos sempre com moderação, com a moderação necessária para nos matar.

Preciso dormir mais um pouco, mas nesse mijo úmido não dá, talvez o sofá de dois lugares em frente à TV, um sofá não pode ser pior que a sobrevida. Se um livro de auto-ajuda fala em 12 passos, eu preciso de um pouco mais, acho que até a sala são uns vinte cinco. Nesses vinte cinco, sigo cambaleando e batendo entre as paredes do corredor, esquerda, direita, esquerda, direita, passo a passo, até cair sublimemente como uma pluma cai do céu ou como um corpo que cai do oitavo andar.

Durmo mais oito horas seguidas, levanto e pego a minha água com gás, bem gelada com uma fatia de limão, sinto a garganta rasgar com o choque da água fria e do gás concentrado. Meu corpo flutua e pesa mais de uma tonelada ao mesmo tempo, é a gravidade brincando com o meu ser. São meus neurotransmissores e minhas bainhas de mielina que brincam comigo como teatro de sombras . É a vida, ou o resto que resta dela. Ligo o estéreo e seleciono a minha seleção de jazz, a ocasião pede luz de velas longe de mim e um jazz suave, quase sombrio, pode ser também um folk rock de um cantor suicida. Durmo mais algumas horas, sonho pouco, sonhos estranhos, alguns com sexo, outros com monstros e candidatos à presidência.

Não sei quanto tempo se passou desde o meu rito, passando pelo meu fracasso, até o momento atual. Fracasso... O insucesso é o fracasso dos otimistas, talvez um dia seja insucesso mijar na cama.

Preciso de um café, um bom café, não daqueles de padaria feitos às pressas com kilos de açúcar, quero um bom grão, um café bem tirado da máquina, para tomar sem açúcar, sentindo a pureza, pensando em poucas coisas puras que ainda há nesse mundo, talvez nem esse café seja puro. Mas prefiro não pensar muito nisso.

No caminho da cafeteria vejo um guri com uma cara chorosa, sozinho em frente ao banco, não sei quantos anos tem o pequeno piá, talvez oito ou dez, é impossível diferenciar crianças quando elas começam a ler aos 6 anos até começar a fumar maconha aos 16. Nesse período todos são iguais, alguns mais iguais que os outros.

- E aí guri, tá perdido? Pergunto com um certo tom de preocupação, não tão preocupado por ele estar perdido, talvez mais preocupado pela responsabilidade de ter que cuidar dele até ele encontrar o pai.

Com uma voz chorosa e presa, como quem sofresse em silêncio uma dor inexplicável, sem tamanho, ele responde:

- ´Tô esperando o meu pai, ele foi pegar dinheiro pra fazer a compra do mês. Já deve ‘tá saindo.

- É perigoso um garoto da sua idade ficar sozinho aqui.

- Ele disse que seria rápido. Porque o senhor está triste?

-Por que me chama de senhor?

- Meu pai me disse pra chamar gente mais velha que a gente de senhor.

-Entendo. Estou triste. Minhas paredes estão caindo e eu estou tropeçando nos meus passos, as pontes pelas quais passei caíram.

- Como assim, senhor?

-Esquece. Esse moletom foi você que escolheu?

-Mais ou menos. Meu pai queria que eu pegasse esse.

O garoto tímido, alto pra idade dele e bem articulado, apesar de poucas palavras, usava um moletom flanelado com uma estampa chamativa, era laranja e azul, uma combinação bem infantil para um garoto com postura de homem, pelo olhar desse guri dava pra ver que pela vida já havia passado maus bocados. O guri de cabeça baixa fazia um vai e vem com a perna.

-Seu pai percebeu que você escolheu essa roupa pra agradá-lo.

-Não sei, senhor. Eu uso pouco essa roupa, não gosto de usar perto dos meus amigos, uso só quando saio com meu pai. Queria um com desenho preto e vermelho. Meu pai tá me chamando. Tchau!

Alguns meses se passaram, minha esperança na vida ainda era fraca. A vida não passa de uma sucessão de acontecimentos repetitivos com pequenas variações imperceptíveis. As cores são dadas pelo eterno conflito do bem e do mal, esquerda e direita, copo meio cheio e copo meio vazio, estampas laranja e azul, e preta e vermelha. A vida tem sentindo na contradição, na antítese e no paradoxo.

Estava decidido Juntei receitas de diversos médicos, e brindes de alguns traficantes. Dessa vez o meu ritual seria com Jack Daniels, o melhor Bourbon, teria Valium, Dormonid e Lexotam. Começaria pelo Lexotan por ser mais fraco, curtiria a onda, a dormência dos olhos. Depois passaria para o Valium, minha boca ficaria mole, as palavras sem sentido e tudo teria um tom cômico. Depois abriria o Jack, sem gelo, como deve ser um Bourbon, e acabaria com o Dormonid. Sentiria meus dedos adormecerem, meus pés, meus braços e minhas pernas...uma gradação de dormência e esperança em não mais palpitar o coração.

Quando saí da farmácia vi o guri. Era um piá, um pequeno guri, mas estava tão alto, tão crescido. Sem barba e com pensamentos e devaneios e usava um moletom. Dessa vez preto e vermelho, discreto, ideal pra sua idade, ou suposta idade pela altura que tinha. Parecia feliz caminhando com passos fortes e largos. Às vezes penso se era um guri ou um homem. Ele passou por mim, me derrubou no chão, minha sacola de compras da mão direita voou longe, minha garrafa caiu no chão mas não quebrou. O Rapaz pediu desculpas, foi bastante educado perguntou se eu estava bem, mas não me reconheceu. Quando levantei, procurei meu kit suicídio e vi que estava no meio da rua, sendo atropelado várias vezes por carros e dentro de uma poça d’água. Merda!

Pelo menos o pequeno herói de moletom com estampa preta e vermelha me deixou com a garrafa de Jack e mais um dia de vida, talvez ache uma linda mulher pra tomar comigo. Talvez chegue em casa e escreva um bilhete na geladeira “ carpe diem”, quem sabe eu não escreva em algum outro dia “carpe vitae”.

de b.varjão

beijo, querido!

11.4.10

Sofia, minha afilhada!

Pensei que o impacto do ritual me seria de pouca importância.
Mas ver o sorriso da Sofia recebendo o óleo ungido, foi muito especial.
Obrigada, Rainha Sofia, minha biscuit de gentinha feliz!
Obrigada, Enz0-Bijú, meu sobrinho adorável, encantador!
Obrigada Bruno e Rafaela por me darem minha primeira afilhada da vida!
Um domingo especial. Sempre.

6.4.10

Noite em Brasília: os gatos nunca são pardos

Se não me falha a memória, minha primeira noite em Brasília foi no Beirute da 109.
Estava com uma tia. Ela estudava Física na UnB.
Eu acho que eu tinha no máximo uns onze anos.
Contando dessa noite, vou ao Beirute desde então. Vinte e muitos anos!

Enquanto a noite em Brasília mudou muito, o Beirute mudou pouco: continua meio ruim, meio sujo, meio estranho. Com cerveja muito gelada e gente muita. E de todo tipo.

Aqui, tem noite e gente pra todo gosto, pra todo gato - não só o pardo:
tem aquele happy hour sensacional em qualquer esquina que você escolher - tem, tem, aqui tem esquina sim. Bares, moquifos, pubs, padarias e botecos pra todo bolso, espalhados por entre as quadras - e quadras são quadradas, logo, há esquinas.

Mas, a cidade tem um estranho hábito de transformar o singelo happy hour do fim do dia de trabalho em uma noitada surreal: porque há festas.
Em todas as vizinhanças, até tarde.
Há festas particulares pagas, que não são tão particulares - geralmente no Setor de Clubes Sul - e também aquelas na casa do amigo do amigo: é só levar o que for beber e um sorriso. Estas últimas, acabam a hora que Deus der bom tempo, e com tanta chuva, andam amanhecendo o dia. Outro dia fui parar numa da embaixada da França. Não, nada oficial: é que tem uns moços que trabalham na embaixada, moram por aqui, e pra se entrosarem...

Pois é. Na noite, você cruza com esse pessoal de embaixada. Mas pode também preferir o subterrâneo do CONIC - um centro comercial que deixa o Parkshopping no chinelo: à noite, putas, travestis e festinhas no melhor estilo inferninho tomam conta de todo o local, bem na frente da Igreja Universal do Reino de Deus. Amém!

Nas quadras residencias, já teve muita boate legal - uma portinha ingênua e gente enlouquecendo lá dentro.
Que tipo de música? Escolha seu estilo, vai ter um canto tocando, não se preocupe. Ultimamente, com a lei do silêncio imperando, bares com música, boates e afins estão ficando mais isolados, em setores comerciais e áreas fora do Plano - só o Gate's salva. O lugar tá ali há décadas, pouco melhor que em 70. Mais fedido, mais caro e mais enfim - igual. Ainda assim, ótimo lugar pra balançar o esqueleto e beijar na boca.

Ah, sim. O beijo na boca: pra todos os gêneros e gostos, o beijo na boca é totalmente possível.
As meninas brasilienses têm má fama, admito: narizinho empinado e carinha de azedas, mas elas não enganam ninguém - brasilienses adoram dançar, beijar na boca, beber todas e tomar café da manhã na padaria antes de subir pra casa. E eu assino embaixo, só não sou azedinha. Virei caipiroska com muito açúcar!

Esse seria o post mais longo de todos porque ainda nem comecei a falar dos shows, eventos, performances; da Orquestra Sinfônica grátis, do Teatro Nacional, da sala FUNARTE, dos tantos e tantos festivais de cinema patrocinados por todas as embaixadas do mundo que ficam aqui.

E daria um post sozinho as infinitas manifestações noturnas no gramado da Esplanada: grátis, à noitinha, de madrugada. Palcos, telões, gigantescas caixas de som viram pequenas peças do LEGO, para a diversão ser o objetivo principal. O monta-desmonta faz o ano passar correndo. E já é dia do aniversário da cidade de novo: mais show, mais missa, mais tudo.

Por isso, ficou faltando muito.
Mas...ix, já deu seis e meia. É hora do happy hour e já tem gente me ligando - falou, galera. Vou tomar uma cachacinha aqui na quadra, que essa chuva tá pedindo um esquenta-goela!

beijo pra Marcinha que tá em Washington louca por um choppinho do Boteco.
beijo pro Bruno. Outra sangria no Barça?
beijo pra todos os amigos de noitadas brasilienses. Azedinhos nada, somos todos o açúcar da Capital!

5.4.10

Fé ou simplesmente o fatídico inferno astral

Talvez por ter sido uma visão de Dom Bosco, Brasília já nasceu com um quê de fé.
As pessoas vieram sonhando o discurso do presidente Juscelino.
Com fé na vida nova, no Brasil novinho em folha.
Essa coisa de brasileiro: de ter fé mesmo quando não se tem porquê ter.

Gente de todo canto, com fé de todo jeito.
Do candomblé ao budismo, a nova capital teve espaço pra todo santo, toda energia sideral.

Um mapa astral se formava no dia 21 de abril de 1960.
Brasília é taurina. Bicha tinhosa, família, leal e muito bem humorada.

Sou budista, como sabem. Fui católica até pouco tempo.
Mas não resisto a um bom horóscopo da semana no jornal de domingo.
E de tanto ler, tenho que concordar:
Brasília passa por seu inferno astral, aquele período do ano que antecede nosso aniversário, uma ou duas semanas antes do dia da gente nascer.

Minha cidade natal em poucos dias fará 50 anos e essas semanas estão sendo catársicas!
Governo desmantelado, chuvas alagadoras, espaços públicos abandonados, contraste social alarmante.

Leio horóscopo sim, mas tenho quase certeza que sou budista porque nasci brasiliense: tinha vizinhos da umbanda, da igreja adventista. E uma melhor amiga na escola simplesmente nunca acreditou em Deus.

No Budismo, para cada ação, há uma consequência. Não há inferno astral, mas simplesmente colhemos o que plantamos.
Brasília colhe hoje, as inúmeras sementes burras, tortas e daninhas que todos nós plantamos em 50 anos: só pensando em nós mesmos. Só votando nos amigos. Só agindo na última hora. Com preguiça de tomar a frente, ter iniciativa.

Mas no Budismo também há espaço para o que os Católicos chamam de ressurreição, redenção: o milagre de recomeçar, renascer, criar uma nova vida, uma segunda chance.
Não há segredo: para ter um aniversário de 100 anos melhor, Brasília deve, desde já, tomar atitudes que gerem o bom carma: fazer o bem ao próximo, ser sábia e compassiva com ação, pensamentos corretos.

50 anos em 5.
Esse deve ser o nosso lema para o aniversário de 100 anos! Para que os próximos 5 anos da Capital Federal sejam só de boas coisas, vamos, cada um, nos tornarmos pessoas melhores!
E isso se dá com fé. Qualquer que seja. Afinal, estamos em Brasília.

um beijo pro Guto.


4.4.10

Feriado de Brasiliense: Chapada

Cheguei do feriado hoje.
Visitei o Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros, a 260 km de Brasília.
Praticamente o quintal de Brasília.
Dirigimos por 3 horas até São Jorge - uma vila que faz muita questão de continuar assim - e ficamos na pousada da Lana, a Palipalan (que é uma flor linda do cerrado, você conhece?)

No trajeto, tenho a sensação de que as cidades estão juntando as extremidades umas das outras. Mas, ainda assim, há muito Planalto nesse Brasil.
Os platôs altos e azulados combinam muito com o azul do céu. Que por sinal, estava cinza na maior parte do tempo. O Cerrado intercala com plantações de milho a paisagem. Gado pastando, matas ciliares, galerias.

O caminho vai acalmando a alma, serenando o coração. O belo da natureza me lembra a fluidez da vida que acontece independente de mim, da capital do país e, ao mesmo tempo, me dá a certeza de que estamos todos conectados, ligados por um fio que não esse da civilização. Um alívio traz um suspiro. Sorrio em silêncio.

Com as chuvas, o Cerrado fica mais verde e há flores por todo lado. É uma vegetação estranhíssima, com árvores tão feias que ficam lindas, folhas disfarçadas de flores; flores que parecem galhos.
No chão úmido, a areia branca e fina dá lugar a pedrinhas, pedronas, rochas escuras, mato fechado e de volta à areia fina.

O Cerrado é cíclico, ímpar, surpreendente e belamente estranho.
Demanda de mim uma delicadeza no olhar, uma mudança de perspectiva, um outro jeito de ver e sentir. O Cerrado deve ser olhado com a mente aberta. Ou nada se vê de especial.
Penso se as pessoas são também assim, carentes de um olhar especial, cada um de nós com belezas particulares, só vistas com olhos atentos.

Na chegada à cachoeira, uma cobra: fina, preta e amarelada, olhos pretos e redondos, segurando estática a metade de uma lagartixa na boca.
Estranhamente, não sinto medo, mas orgulho: uma honra enorme de estar nesse exato segundo vivendo no mesmo lugar que uma outra vida padece.
A conexão, o fio invisível, algo que foge das divisões geográfica, política, histórica.

Entro no poço raso de água fria e turva.
Começa a chover muito.
O frio inevitável me dá a real dimensão do meu tamanho nesse mundo imenso:
Um ser minúsculo, sem qualquer controle sobre o todo que me rodeia.
Mas o frio passa, a chuva passa, e seguimos para a próxima trilha, a próxima cachoeira.
Medito sobre o meu trajeto até aqui. Ouço com olhos fechados o ruído da queda d'água. Combina com a batida do meu coração.

No fim do caminho, exausta, dolorida, com frio e com fome, volto à vila.
No dia seguinte, da vila à Brasília.
Na minha casa, volto à realidade. Que no fundo, sempre teve a Chapada como um dos cenários, mas sou eu que a esqueço quando sigo a vida olhando os dias com olhos duros, domados pela rotina da cidade e tanto fios que me amarram aqui e ali.

É, a Chapada mora em mim. O Cerrado mora em mim. Porque eu moro em Brasília e, aqui, esse fio estranho da natureza com o ser humano parece ser mais visível, quase palpável, e muito real. É só olhar para o céu. Ouvir o trovão. Tocar nessa terra vermelha. E sentir o coração bater como a queda da cachoeira.




1.4.10

Trânsito

Morando na Asa Sul, chego na Praça dos Três Poderes em exatos sete minutos se for de Zebrinha.
Asa Sul é uma espécie de bairro do Plano Piloto, o famoso avião do desenho de Brasília.
A Praça dos 3 Poderes é como a cabine do piloto.
E Zebrinhas são os micro-ônibus que circulam somente no Plano. Sim, o Piloto.

Então, eu moro numa Superquadra da Asa Sul por onde passa a avenida L2. (o L vem de LESTE, e o 2, vem da sequência numérica: L1, L2, L3, L4... )
Superquadra é um jeito que o Niemeyer achou de renomear quarteirão. A gente não acha nada de super, é um quarteirão mesmo. Nós que moramos aqui só chamamos de quadra, tá bom demais.
Enfim, a minha quadra fica na beirinha da L2, onde passa o Zebrinha para o Congresso Nacional. Eu trabalho lá. Bem debaixo da bacia, a de cabeça pra cima - que é a Câmara dos Deputados. Esse formato é uma metáfora pra dizer que os deputados ouvem o povo. Não entendi. Mas foi assim que aprendi na escola. Ouvem quem? Da bacia? Ah sei...

Ouvindo ou não o povo da bacia, pago dois reais para pegar o Zebrinha que me deixa na porta do trabalho. Lindo: Economizo poluição no planeta e não me chateio para procurar uma vaga. Sim, num complexo de prédios como a Esplanada, o Niemeyer achou que todos nós iríamos a pé. Ou isso, ou nossos governadores continuam achando que a frota de ônibus da cidade já está de bom tamanho. Não, não está.
O Zebrinha da manhã me deixa no trabalho sem atraso. Já na volta, espero uma média de 15 minutos no ponto e chego em casa mais ou menos 20 minutos depois. Com sorte!
Ainda assim, isso é reclamar de barriga cheia.

A Helena, baiana de Porto Seguro, chegou em Brasília adolescente na década de 70 e foi trabalhar como empregada doméstica na casa da minha mãe. Desde essa época, mora no Setor P da Ceilândia.
Ceilândia é a maior cidade de Brasília. Quero dizer, do Distrito Federal, porque Brasília mesmo é só o tal avião. E nem é cidade, Ceilândia. É região administrativa; ou Cidade Satélite, caso o avião voasse no espaço sideral. O Niemeyer deve achar genial as tais Cidades Satélites. Vou convidá-lo para ir à casa da Helena num dia de semana, fim de expediente. De ônibus.

Do Setor P ao Plano são duas horas e meia em pé no ônibus entupido. A Helena está solteira, nunca teve filhos, é convertida da Igreja Evangélica e tem mais de 60 anos.
Para voltar para casa, ela passa pela mesma ladainha. Isso, piorando com o tempo. Ela tem 32 anos de serviço.
E o metrô não melhorou em nada esse trajeto. Até porque, quando chega na parada da Helena lá na Ceilândia, os carros do trem já estão lotados. Eu falei que o metrô anda a 50km por hora? Ah, tá...

Mas, graças aos nossos governadores, cada ano que passa há novas vias de acesso para a Ceilândia. O número de ônibus se mantém mais ou menos o mesmo. A Helena não acha que as vias de acesso melhoraram o trajeto casa-trabalho. Nem o Niemeyer. Mas ele já não acha nada faz tempo.
Já a Helena, tem certeza absoluta que a questão não é construir avenidas, mas melhorar o transporte público. Eu concordo.
Ela vem de ônibus, e eu vou de carro para chegar em casa mais cedo. De um modo ou de outro, somos mais de dois milhões de habitantes com o exato mesmo dilema: como deixar os carros em casa, chegar em tempo no compromisso, pagar o preço justo pelo transporte? Como manter a cidade verde, livre de poluição, circular em bicicletas, ter acesso a qualquer ponto do Distrito Federal num ônibus?
Isso não é mais problema do Niemeyer.
Nem dos nossos governadores. Aliás, que governadores?